Flores do Campo. João de Deus

Flores do Campo - João de Deus


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quando abraço e beijo

      O travesseiro e, assim,

      Acórdo e te não vejo,

      Vejo-me só a mim;

      Não sei, mulher! que anceio

      Se me traduz n’um ai!

      Confrange-se-me o seio,

      Rebenta o pranto e cái.

      Então, se por encanto

      Fallando em ti, mas só,

      Todo banhado em pranto

      Me visses, tinhas dó.

      Tinhas. A piedade

      É filha da mulher,

      Que sempre quiz metade

      D’uma afflicção qualquer.

      Havias ao teu rosto

      De me apertar a mim,

      D’encher, fartar de gosto,

      Todo este abysmo; sim.

      Vós desprezaes embora

      Culto e adoração

      De quem vos ama; agora

      As dôres, essas não.

      Messines.

      A D. CANDIDA NAZARETH

      Por occasião da morte de sua irmã Rachel e, poucos dias depois, de sua mãi

      Despe o luto da tua soledade

      E vem junto de mim, lirio esquecidox

      Do orvalho do céo!

      Tens nos meus olhos pranto de piedade,

      E se és, mulher! irmã dos que hão soffrido,

      Mulher! sou irmão teu.

      Consolos não te dou, que não existe

      Quem de lagrimas suas nunca enxuto

      Possa as d’outro enxugar:

      Não póde allivios dar quem vive triste,

      Mas é-me dôce a mim chorar se escuto

      Alguem tambem chorar.

      Botão de rosa murcho á luz da aurora!

      Que peccado equilibra o teu martyrio

      Na balança de Deus?

      Se é como justo e bom que elle se adora

      Quem te ha mudado a ti, ó rosa! em lirio,

      E em lirio os labios teus?

      Não enche elle de balsamos o calix

      Da flôr a mais humilde, e esses espaços

      Não enche elle de luz?

      Não veio o Filho seu, lirio dos valles!

      Só por amor de nós tomar nos braços

      Os braços d’uma cruz?

      Mulher, mulher! quando eu n’um cemiterio

      Levanto o pó dos tumulos sósinho:

      Eis, digo, eis o que eu sou.

      Mas quando penso bem n’esse mysterio

      Da virtude infeliz: vai teu caminho;

      Dois mundos Deus creou.

      Deus não dispara a setta envenenada

      Á pombinha que aos ares despedira

      Com mão traidora e vil.

      Imagem sua, Deus não volve ao nada,

      Não aniquila a flôr que ao chão cahira

      Lá d’esse eterno abril.

      Has-de, cysne! expirando alçar teu canto,

      Has-de lá quando a lua da montanha

      Te acene o extremo adeus,

      Voar, Candida! ao céo, e ebria de encanto,

      No oceano d’amor que as almas banha,

      Unir teu canto aos seus.

      Seus, d’ellas, mãi e irmã, cinzas cobertas

      D’um só jacto de terra… oh desventura!

      Oh destino cruel!

      Vejo-as ainda ir com as mãos incertas

      Guiando-se uma á outra á sepultura,

      E a mãi: Rachel! Rachel!

      Coimbra.

      AMOR

      Amo-te muito, muito.

      Reluz-me o paraiso

      N’um teu olhar fortuito,

      N’um teu fugaz sorriso.

      Quando em silencio finges

      Que um beijo foi furtado

      E o rosto desmaiado

      De côr de rosa tinges;

      Dir-se-ha que a rosa deve

      Assim ficar com pejo,

      Quando a furtar-lhe um beijo

      O zephyro se atreve;

      E ás vezes que te assalta

      Não sei que idéa, joven!

      Que o rosto se te esmalta

      De lagrimas que chovem;

      Que fogo é que em ti lavra

      E as forças te aniquila,

      Que choras, mas tranquilla,

      E nem uma palavra?

      Oh! se essa mudez tua

      É como a que eu conservo,

      Lá quando á noite observo

      O que no céo fluctua;

      Ou quando, á luz que adoro,

      Ás horas do infinito,

      Nas rochas de granito

      Os braços cruzo e chóro;

      Amamo-nos… Não cabe

      Em nossa pobre lingua

      O que a alma sente, á mingua

      De voz, que só Deus sabe.

      Coimbra.

      A DONZELLA E O MUSGO

      Um dia, não sei que eu tinha…

      Uma tristeza tamanha!

      E lembra-me ir á montanha,

      Que temos aqui vizinha,

      Onde em tempo me entretinha

      Horas e horas sósinha

      Quando ainda se não estranha

      Que n’uma teia de aranha

      Se prenda uma innocentinha,

      Ou atraz d’uma avesinha

      Se cance a vêr se a apanha.

      Depois é que o mundo falla

      E se mette com a vida

      De quem ás vezes se cala

      Por ser mais bem procedida.

      Que esta gente que faz gala

      Em coisa, que vê, contal-a,

      E sendo mal permittida

      Inda em cima acrescental-a,

      Teem a lingua comprida

      E bem deviam cortal-a.

      Vou pelo córrego


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