Ley, porque V. Magestade ha por bem restituir aos indios do Grão Pará, e Maranhão a liberdade das suas pessoas, e bens etc.. Unknown

Ley, porque V. Magestade ha por bem restituir aos indios do Grão Pará, e Maranhão a liberdade das suas pessoas, e bens etc. - Unknown


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y, porque V. Magestade ha por bem restituir aos indios do Grão Pará, e Maranhão a liberdade das suas pessoas, e bens etc

      Dom Joseph por graça de Deos Rey de Portugal, e dos Algarves dáquem, e dálem mar em Africa, Senhor de Guiné, e da Conquista, navegaçaõ, e commercio de Ethiopia, Arabia, Persia, e da India, &c. Faço saber aos que esta Ley virem, que, mandando examinar pelas pessoas do meu Concelho, e por outros Ministros doutos, e zelosos do serviço de Deos, e meu, e do bem commum dos meus Vassallos, que me pareceo consultar, as verdadeiras causas com que desde o descobrimento do Graõ Pará, e Maranhaõ até agora naõ só se naõ tem multiplicado, e civilizado os Indios daquelle Estado; desterrando-se delle a barbaridade, e o gentilismo, e propagando-se a doutrina Christãa, e o numero dos Fiéis allumiádos da luz do Evangelho; mas antes pelo contrario todos quantos Indios se desceraõ dos Sertoens para as Aldeas em lugar de propagarem, e prosperarem nellas de sorte, que as suas cõmodidades, e fortunas servissem de estimulo aos que vivem dispersos pelos matos para virem buscar nas povoaçoens pelo meio das felicidades temporaes o maior fim da bemaventurança eterna, unindo-se ao gremio da Santa Madre Igreja se tem visto muito diversamente, que, havendo descido muitos milhoens de Indios, se foraõ sempre extinguindo de modo, que he muito pequeno o numero das povoaçoens, e dos moradores dellas; vivendo ainda estes poucos em taõ grande miseria, que em vez de convidarem, e animarem os outros Indios barbaros a que os imitem, lhes servem de escandalo para se internarem nas suas habitaçoens silvestres com lamentavel prejuizo da salvaçaõ das suas Almas, e grave damno do mesmo Estado, naõ tendo os habitantes delle quem os sirva, e ajudem para colherem na cultura das terras os muitos, e preciosos frutos em que ellas abundaõ: Foi assentado por todos os votos, que a causa, que tem produzido taõ perniciosos effeitos, consistio, e consiste ainda em se naõ haverem sustentado efficazmente os ditos Indios na liberdade, que a seu favor foi declarada pelos Summos Pontifices, e pelos Senhores Reys meus predecessores, observando-se no seu genuino sentido as Leys por elles promulgadas sobre esta materia nos annos de mil e quinhentos e setenta, mil e quinhentos oitenta e sete, mil e quinhentos noventa e cinco, mil seiscentos e nove, mil e seiscentos e onze, mil seiscentos quarenta e sete, mil e seiscentos sincoenta e sinco: cavillando-se sempre pela cubiça dos interesses particulares as disposiçoens destas Leys, até que sobre este claro conhecimento, e sobre a experiencia do que havia passado a respeito dellas, estabeleceo ElRey meu Senhor, e Avô, no primeiro de Abril de mil e seiscentos e oitenta (para de huma vez obviar a taõ perniciosas fraudes) a Ley, cujo teor he o seguinte.

      Ley do primeiro de Abril de mil seiscentos e oitenta

      «Dom Pedro Principe de Portugal, e dos Algarves como Regente, e successor destes Reynos &c. Faço saber aos que esta Ley virem, que sendo informado ElRey meu Senhor, e Pay que Deos tem, dos injustos cativeiros, a que os moradores do Estado do Maranhaõ por meios illicitos reduziaõ os Indios delle, e dos graves damnos, excessos, e offensas de Deos, que para este fim se cõmettiaõ, fez huma Ley nesta Cidade de Lisboa em nove de Abril de mil seiscentos sincoenta e sinco, em que prohibio os ditos cativeiros, exceptuando quatro casos, em que de direito eraõ justos, e licitos; a saber quando fossem tomados em justa guerra, que os Portuguezes lhe movessem, intrevindo as circumstancias na dita Ley declaradas; ou quando impedissem a prégaçaõ Evangelica, ou quando estivessem prezos á corda para serem comidos; ou quando fossem remdidos por outros Indios, que os houvessem tomado em guerra justa, examinando-se a justiça della na fórma ordenada na dita Ley. E por naõ haver sido efficaz este remedio, nem o de outras Leys antecedentes do anno de mil e quinhentos e setenta, mil quinhentos oitenta e sete, mil quinhentos noventa e sinco, mil seiscentos sincoenta e dous, mil seiscentos sincoenta e tres, com que o dito Senhor Rey meu Pay, e outros Reys seus predecessores procuraraõ atalhar este damno; antes se haver continuado até o presente com grave escandalo, e excessos contra o serviço de Deos, e meu; impedindo-se por esta causa a conversaõ daquella gentilidade, que desejo promover, e adiantar, o que deve ser, e he o meu primeiro cuidado; tendo mostrado a experiencia que, supposto sejaõ licitos os cativeiros por justas razoens de Direito nos casos exceptuados na dita ultima Ley de seiscentos sincoenta e sinco, e nas anteriores, com tudo que saõ de maior ponderaçaõ as razoens que ha em contrario para os prohibir em todo o caso, serrando a porta aos pretextos simulaçoens, e dólos com que a malicia abusando dos casos, em que os cativeiros saõ justos, introduz os injustos, enlaçando-se as consciencias, naõ sómente em privar da liberdade aquelles a quem a communicou a natureza, e que por Direito natural, e positivo saõ verdadeiramente livres; mas tambem nos meios illicitos de que usaõ para este fim: Desejando reparar taõ graves damnos, e inconvenientes, e principalmente facilitar a conversaõ daquelles Gentios, e pelo que convém ao bom governo, tranquillidade, e conservaçaõ daquelle Estado, com parecer dos do meu Conselho, ponderada esta materia com a madureza, que pedia a importancia della; e examinando-se as Leys antigas, e as que especialmente sobre este particular se estabeleceraõ para o Estado do Brasil, onde por muitos annos se experimentaraõ os mesmo damnos, e inconvenientes, que ainda hoje duraõ, e se sentem no do Maranhaõ: Houve por bem mandar fazer esta Ley, conformando-me com a antiga de trinta de Julho de seiscentos e nove, e com a Provisaõ que nella se refere de sinco de Julho de seiscentos e sinco passadas para todo o Estado do Brasil. E renovando a sua disposiçaõ ordeno, e mando que da qui em diante se naõ possa cativar Indio algum do dito Estado em nenhum caso, nem ainda nos exceptuados nas ditas Leys, q̃ Hei por derogadas, como se dellas, e das suas palavras fizera expressa, e declarada mençaõ, ficando no mais em seu vigor: e succedendo que algũa pessoa, de qualquer condiçaõ, e qualidade que seja, cative, e mande cativar algũ Indio publica ou secretamente, por qualquer titulo, ou pretexto que seja, o Ouvidor geral do dito Estado o prenda, e tenha a bom recato, sem neste caso conceder Homenagem, Alvará de fiança, ou fiéis Carcereiros; e com os autos, que formar, o remetta a este Reino entregue ao Capitaõ, ou Mestre do primeiro Navio, que para elle vier, para nesta Cidade o entregar no Limoeiro della, e me dar conta para o mandar castigar como me parecer. E tanto que o dito Ouvidor geral lhe constar do dito cativeiro porá logo em sua liberdade o dito Indio, ou Indios, mandando-os para qualquer das Aldeas dos Indios Catholicos, e livres, que elle quizer. E para me ser mais facilmente presente se esta Ley se observa inteiramente: Mando que o Bispo, e Governador daquelle Estado, e os Prelados das Religioens delle, e os Parocos das Aldeas dos Indios, me dem conta pelo Conselho Ultramarino, e Junta das Missoens dos transgressores, que houver da dita Ley, e de tudo o que nesta materia tiverem noticia, e for conveniente para a sua observancia. E succedendo mover-se a guerra defensiva, ou offensiva a alguma Naçaõ dos Indios do dito Estado nos casos, e termos, em que por minhas Leys, e ordens he permittido; os Indios, que na tal guerra forem tomados, ficaráõ sómente prizioneiros como ficaõ as pessoas que se tomaõ nas guerras de Europa, e sómente o Governador os repartirá como lhe parecer mais conveniente ao bem, segurança do Estado, pondo-os nas Aldeas dos Indios livres Catholicos, onde se possaõ reduzir á Fé, e servir o mesmo Estado, e conservarem-se na sua liberdade, e com o bom tratamento, que por ordens repetidas está mandado, e de novo mando, e encommendo se lhe dê em tudo, sendo severamente castigado quem lhes fizer qualquer vexaçaõ, e com maior rigor os que lhas fizerem no tempo em que delles se servirem por se lhes darem na repartiçaõ. Pelo que mando aos Governadores, e Capitaens móres, Officiaes da Camera e mais Ministros do Estado do Maranhaõ, de qualquer qualidade, e condiçaõ que sejaõ, a todos em geral, e a cada hum em particular, cumpraõ, e guardem esta Ley, que se registarà nas Cameras do dito Estado; e por ella Hei por derogadas naõ sómente as sobreditas Leys, como assima fica referido; mas todas as mais, e quaesquer Regimentos, e Ordens, que haja em contrario ao disposto nesta, que sómente quero que valha, tenha força, e vigor, como nella se contém, sem embargo de naõ ser passada pela Chancellaria, e das Ordenaçoens, e Regimentos em contrario. Lisboa, o primeiro de Abril de mil seiscentos e oitenta.»

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