Codigo de Processo Civil (Portugal). Portugal
sso Civil
DL n.º 52/2011, de 13/04
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Na área da justiça, integra o Programa do XII Governo Constitucional a afirmação inequívoca do prosseguimento de uma linha de «desburocratização e de modernização, ao mesmo tempo capaz de responder pela segurança e pela estabilização do quadro jurídico-legislativo, em que se aponta, nomeadamente para a conclusão da revisão já iniciada pelo governo anterior do Código de Processo Civil, elaborando-se, complementarmente, os diplomas de desenvolvimento que lhes rentabilizem a eficácia».
Tal facto levou a que tenham sido delineadas as linhas mestras de um modelo de processo, apontando para uma clara opção de política legislativa e cujos objectivos impõem que se chegue a um quadro normativo que garanta, a par da certeza e da segurança do direito e da afirmação da liberdade e da autonomia da vontade das partes, a celeridade nas respostas, confrontando o direito processual civil com exigências de eficácia prática por forma a tornar a justiça mais pronta e, nessa medida, mais justa.
Estas linhas mestras assentam nos seguintes parâmetros:
Distinção entre o conjunto de princípios e de regras, que, axiologicamente relevantes, marcam a garantia do respeito pelos valores fundamentais típicos do Processo Civil, e aquele outro conjunto de regras, de natureza mais instrumental, que definem o funcionamento do sistema processual;
Recurso, no primeiro caso, à adopção de cláusulas gerais, prevendo-se, sempre que seja caso disso, a sua concretização em diplomas de desenvolvimento;
Garantia de prevalência do fundo sobre a forma, através da previsão de um poder mais interventor do juiz, compensado pela previsão do princípio de cooperação, por uma participação mais activa das partes no processo de formação da decisão;
Maior intervenção das partes em matéria da comunicação dos actos e de recolha da prova;
Menor judicialização do processo na fase dos articulados, com remissão do despacho liminar para o termo destes, com vista à marcação de uma primeira audiência e definição da respectiva ordem de trabalhos, tendo esta como objecto, além do mais, o conhecimento das excepções, a possível conciliação das partes, a fixação da matéria de facto aceite e controvertida e, quando possível, a discussão e o julgamento.
A explanação e a concretização destes princípios gerais encontram-se definidos nas «Linhas orientadoras da nova legislação processual civil», que, submetidas a debate público, mereceram um muito satisfatório acolhimento por parte dos diversos operadores judiciários, permitindo concluir que o caminho está traçado.
Pretende-se prosseguir uma linha de desburocratização e de modernização, com a vista a melhor atingir a qualidade na prestação de serviços ao cidadão que recorre aos tribunais, esforço esse que passa, nomeadamente, por uma verdadeira simplificação processual.
Visa, deste modo, a presente revisão do Código de Processo Civil torná-lo moderno, verdadeiramente instrumental no que toca à perseguição da verdade material, em que nitidamente se aponta para uma leal e sã cooperação de todos os operadores judiciários, manifestamente simplificado nos seus incidentes, providências, intervenção de terceiros e processos especiais, não sendo, numa palavra, nem mais nem menos do que uma ferramenta posta à disposição dos seus destinatários para alcançarem a rápida, mas segura, concretização dos seus direitos.
Pretende-se ainda que se opere uma mudança que também é uma opção por uma clara ruptura, não no sentido de ruptura com o passado, mas de ruptura manifesta com a actual legislação, com o objectivo de ser conseguida uma tramitação maleável, capaz de se adequar a uma realidade em constante mutação, de ser detentora de uma linguagem clara, acessível, que não prossiga e persiga velhas e ultrapassadas querelas doutrinárias, mas que aponte, a par da certeza e da segurança do direito e da afirmação da liberdade e da autonomia da vontade das partes, para claros índices de eficácia.
Ter-se-á de perspectivar o processo civil como um modelo de simplicidade e de concisão, apto a funcionar como um instrumento, como um meio de ser alcançada a verdade material pela aplicação do direito substantivo, e não como um estereótipo autista que a si próprio se contempla e impede que seja perseguida a justiça, afinal o que os cidadãos apenas pretendem quando vão a juízo.
É, assim, o processo civil um instrumento ou talvez mesmo uma alavanca no sentido de forçar a análise, discussão e decisão dos factos e não uma ciência que olvide esses factos para se assumir apenas como uma teorética de linguagem hermética, inacessível e pouco transparente para os seus destinatários.
Optou-se, na elaboração desta revisão do Código de Processo Civil por proceder a uma reformulação que, embora substancial e profunda de diversos institutos, não culmina na elaboração de um Código totalmente novo.
Na verdade, para além de tal desiderato se revelar, em boa medida, incompatível com os limites temporais estabelecidos para o encerramento dos trabalhos, não se procurou, através dela, uma reformulação dogmática ou conceptual das bases jurídico-processuais do Código, mas essencialmente dar resposta, tanto quanto possível pronta e eficaz, a questões e problemas colocados diariamente aos diferentes sujeitos e intervenientes nos processos, conferindo a este maior celeridade, eficácia e justiça na composição dos litígios.
Considera-se, para além disto, que a opção tomada – ao deixar, em larga medida, intocada a estrutura conceptual e sistemática do Código, em tudo aquilo que não colida com os princípios ordenadores do processo, a implementar através da presente revisão da lei de processo – facilitará a apreensão das novas soluções pelos operadores judiciários, que as irão encontrar plasmadas em normas e locais sistematicamente conhecidos e permitirá que as soluções mais inovadoras venham a ser testadas pela prática forense, de modo que, no futuro, a elaboração do verdadeiro novo Código de Processo Civil possa assentar e ser ponderado já em função do relevante contributo da experiência e da concreta prática do foro.
Foram tidos em consideração quer os valiosos contributos de anteriores trabalhos de revisão – cujas soluções se adoptaram sempre que se revelaram compatíveis com a filosofia lógica que se pretendeu imprimir ao novo processo civil – quer os resultados da útil e fecunda discussão pública que sobre eles incidiu, designadamente os contributos da Ordem dos Advogados e do grupo de trabalho constituído no âmbito do Centro de Estudos Judiciários.
Os princípios gerais estruturantes do processo civil, em qualquer das suas fases, deverão essencialmente representar um desenvolvimento, concretização e densificação do princípio constitucional do acesso à justiça.
Na verdade, tal princípio não se reduz à mera consagração constitucional do direito de acção judicial, da faculdade de qualquer cidadão propor acções em tribunal, implicando, desde logo, como, aliás, a doutrina vem referindo, que a todos seja assegurado, através dos tribunais, o direito a uma protecção jurídica eficaz e temporalmente adequada.
Tal garantia constitucional implica o direito ao patrocínio judiciário, sem limitações ou entraves decorrentes da condição social ou económica, mas, igualmente, a obter, em prazo razoável, decisão judicial que aprecie com força de caso julgado a pretensão regularmente deduzida em juízo, a faculdade de requerer, sem entraves desrazoáveis ou injustificados a providência cautelar que se mostre mais adequada a assegurar o efeito útil da acção e a possibilidade de, sempre que necessário, fazer executar, por via judicial, a decisão proferida e não espontaneamente acatada.
O direito de acesso aos tribunais envolverá identicamente a eliminação de todos os obstáculos injustificados à obtenção de uma decisão de mérito, que opere a justa e definitiva composição do litígio, privilegiando-se assim claramente a decisão de fundo sobre a mera decisão de forma.
A obtenção de uma decisão judicial que aprecie o mérito da pretensão deduzida ou ordene as providências cautelares ou executivas, destinadas a assegurá-la ou realizá-la coercivamente, dependerá estritamente da verificação dos pressupostos processuais de que a lei faz depender a regularidade da instância.
Como concretização desta ideia, importará fazer especial referência à revogação dos preceitos que, no regime vigente, condicionam o normal prosseguimento da instância e a obtenção de uma decisão de mérito, ou o uso em juízo de determinada prova