Diccionario de João Fernandes. Francisco Gomes de Amorim

Diccionario de João Fernandes - Francisco Gomes de Amorim


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de varias especies. O que não come palha é dos peiores.

      BEXIGA– A deusa da actualidade.

      – Discurso laudatorio.

      BIBLIOTHECARIO– Um collega da traça.

      BICHAS– Prefiram as de rabiar.

      BOFETADA– Conclusão, que em alguns casos se torna principio.

      – Troco dado sem ser pedido.

      – Visita mal recebida.

      – Resposta em vulto.

      – Eloquencia da mão direita.

      – Argumento solido.

      BOI– Animal que muda o sexo depois de morto.

      BOMBA– Noticia inesperada.

      BOMBEIRO– Inimigo de innovações.

      BONDADE– Qualidade que attrahe o abuso.

      BORBORYGMOS– O gargantear das tripas.

      BOTAS– Terror dos selvagens. Umas botas apertadas, umas calças com suspensorios e prezilhas, e um collarinho bem teso – eis os beneficios que a civilisação offerece, de envolta com os seus vicios, ao homem primitivo! Entalado, esticado e gemendo dentro d'essas prisões, o pobre diabo, costumado a ter como a sua melhor riqueza a liberdade de movimentos, atira com tudo isso para longe de si, no primeiro ensejo, e foge para os seus bosques, arma o arco e espreita por entre as arvores os inquisidores que o atormentaram para lhes agradecer a judiaria com frechadas. Se estes, porém, o avistam primeiro, e lhe mostram de longe uma bota e um par de calças, o desgraçado larga as armas, e precipita-se no rio, preferindo ser comido pelos jacarés, ou morrer afogado, a dar-se em holocausto áquellas machinas de tratos.

      BOTEQUIM– Escola de bellas-letras e de bons costumes.

      BOTICARIO– Agente do coveiro.

      BRAZÃO– Estudo dos fosseis.

      BRUTO– Animal commum: morde e dá coice.

      BUGIO– Parodia humana.

      BURLESCO– Annuncio em que se promettem enterros pobres fingindo de ricos. É de tentar os defuntos mais exigentes?

      BURRA– A personificação do amor moderno. Se Balaam cá voltasse, veria o que é eloquencia! As burras de hoje teem todas o diabo no corpo, um diabo amarello e luzente, que faz dar urros a quem o quer apanhar!

      BURRO– Irracional a quem muita gente faz concorrencia.

      C

      CABEÇADA– Mais vale sentil-a sem a trazer do que trazel-a sem a sentir.

      CABELLEIRA– Illusão… para quem a traz.

      CABELLO– Uma canção saudosa, cantada em côro por todos os calvos.

      CABRESTO– Leme que governa á prôa. Nem sempre se põe a quem mais precisa d'elle.

      CAÇA– A mais procurada é a dos grandes empregos; sobretudo da especie sinecura.

      CACETADA– Um dos modos de exprimir o pensamento.

      CACETE– Uma idéa… politica.

      CACHORRO– Expressão affectuosa, no nosso tempo.

      CADUCIDADE– Infancia sem mãe nem mama.

      CAHOS– Olhae á roda de vós.

      CAÍM– Primeiro exemplo de fraternidade, e segunda victoria do mal contra o bem. Desde então teem sido tantos os casos, que já se perdeu a conta d'elles.

      CAÍR– Emprestar a caloteiros.

      CALÇADO– Flagello que se impõe aos selvagens, a pretexto de os civilisar.

      CALLO– Perdão, minhas senhoras! É com o mais profundo respeito, e por interesse vosso, que vos aconselho a não coxear. Não ha paixão que lhe resista. Um pé pequeno é bello. Não deixeis suspeitar que elle se parece com um banco de ostras. Cautela com a baixa-mar! Não consintaes sequer que o vosso King Charles vos veja tirar as meias. O diabo ás vezes arma-as!

      CALOTE– Ferida ruim.

      CALOTEIRO– Ente feliz, que achou quem lhe fiasse.

      CALUMNIA– Nodoa, que se chega á pelle nunca mais se tira.

      CALUMNIADOR– Sujeito que atira pedras a uma sombra, e consegue por vezes acertar-lhe.

      CALVA– Solidão melancolica.

      – Terreno esterilisado pelos annos.

      – Arvore, d'onde cairam as ultimas folhas.

      – Pedra tumular, em cuja superficie pallida e lustrosa se reflecte a morte… dos cabellos.

      CALVO– Audacioso, que ainda falla verdade… com a cabeça.

      CAMELLO– O mais injuriado dos animaes. Até confundem certos homens com elle!

      CAMISA– Uma convenção social.

      CAMISEIRO– Aio da pudicicia.

      CANADA– Uma das nossas glorias passadas, que o litro assassinou.

      CANALHA– Tomado á franceza, é gallicismo; porém a abundancia de genero nacionalisou-o.

      CANÇÃO– O chiar lyrico da frigideira, onde bailam as pescadinhas de rabo na bôca.

      CANDIDATO (A DEPUTADO) – Projecto de caustico no paiz.

      CANEIRO– O cocyto de Alcantara. Desemboca no Phlegetonte, vulgo Tejo, que é outro lameiro pestilento, nas praias de Lisboa.

      CANGA– Benção matrimonial.

      CANNA (DA INDIA) – Materia prima das azas de pau.

      CANNIBAL– Grande mamador da teta do orçamento.

      CANO (DE DESPEJO) – Fornecedor dos cemiterios de Lisboa.

      – Um socio da medicina.

      CANONISAR– Fingir que se abre aos outros uma porta de que não se tem a chave.

      CANTO– A alma buscando outra patria.

      CANTORA (CELEBRE) – Prodigio de aluguel.

      – Escandalo ambulante, á moda Patti.

      CAPACHO– Limpa-botas, que ss. ex.as elevam às vezes até á altura de poder limpar tambem as algibeiras á mãe patria.

      CAPADO– Mortal do genero neutro.

      CARA– Desconfiae das taboletas.

      CARACOL– Coração de mulher leviana. Por mais que se lhe corte a cabeça, revive sempre, e apega-se a todas as plantas.

      CARACTER– Torneira que só quando serve se vê se está rota.

      CARANGUEJO– Exemplificação dos nossos systemas de viação accelerada. Isto é: progresso do retrocesso, segundo a feliz expressão de um sabio frade bernardo.

      CARAPUÇA– Barrete que se põe dando urros intimos.

      CARESTIA– Synonymo de subsistência, em Lisboa.

      – Doença


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