Minotauro. Sergio Ochoa Meraz

Minotauro - Sergio Ochoa Meraz


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e a parede.

      + Não se preocupe, não se sinta desconfortável, eu entendo. Haverá outra oportunidade, costumo vir cá com frequência. O grande Mike pode testemunhar isso, certo Mike? Agora era o empregado que corava. Apesar de estar a uma distância prudente, nunca pensou que Jorge o incluiria na conversa. Muito contente, acenou à menção da sua pessoa com um gesto silencioso de aprovação. Jorge ergueu levemente o copo para o cumprimentar e depois tomar um gole final da sua segunda cerveja.

      - Olhe Jorge, já aqui estamos e, se deixarmos à sorte, será difícil coincidir. Deixe-me dar-lhe os meus dados, dê-me só o tempo de chegar a casa primeiro; a minha mãe já deve estar louca; espero por si, não me deixe ficar mal!

      + “Nunca faria isso!” Ele pegou no cartão de visita e colocou-o no bolso interno do casaco.

      Jorge não costumava aceitar aquele tipo de convites, presumia que já representavam um compromisso e era o que menos queria. Bebeu mais umas duas cervejas e estava decidido a ficar lá, mas havia algo de extraordinário naquela ocasião e, de repente, quis investigar aquele impulso. Não eram apenas as pernas longas de Mariana, era algo que ela precisava enfrentar - um escrutínio académico estrito -, dizia para si próprio a sorrir, como se estivesse a justificar a decisão de atender ao convite de Mariana.

      Capítulo 5

      Mestre Jacobo

      O amigo mais próximo do engenheiro Salgado era o mestre Jacobo Aguilar, que além de serem colegas de quarto e terem a mesma licenciatura, também compartilhavam um gosto obsoleto pela leitura. Eram uns estudiosos, que costumavam passar longas horas a rever livros e a compartilhar dados, fosse como parte dos deveres de custódia dos livros da fraternidade ou como uma jornada pessoal; pareciam duas crianças toda a vez que uma remessa chegava de uma editora ou um pedido especial. O professor Jacobo Aguilar era o proprietário da Livraria A Bússola, localizada na esquina da Rua Libertad e da 15ª rua, no centro da cidade.

      Quando Jacobo recebia uma daquelas caixas com livros pelo correio, notificava imediatamente o engenheiro Salgado, que cancelava todos os seus compromissos naquele dia, ia para casa, comia às pressas e fazia-se acompanhar da sua filha para ir à livraria do Tio Jacobo. No caminho, paravam para comprar gelado, amendoim ou algum doce para adornar o evento.

      A pequena Mariana também carregava os seus livros de colorir e a sua caneta sortida. Bem, pelo menos eram assim estas visitas enquanto Mariana ainda era criança. Uma vez que cresceu, perdeu o interesse em acompanhar o pai onde quer que fosse e, na adolescência, nem sequer podia tolerar estar perto dele.

      O último volume do diário de Jacobo Aguilar era o volume XVI, que começava no final de julho de 1971 e ia até fevereiro de 1972, onde era relatado, por vezes em detalhes, outras vezes de forma superficial no dia a dia do pessoal. Reuniões, assuntos abordados, compras e vendas dos seus livros, consultas, consultas pendentes e até visitas ao médico eram citadas nesse texto.

      Aquele volume estava sob a proteção zelosa da viúva de Aguilar, a Dona Julia, que percorria com detalhes dolorosos os últimos meses da vida do seu parceiro, do seu amigo, tentando perceber o que tinha acontecido.

      O caderno já tinha as marcas da leitura obsessiva; frenética. A Tia Julia fazia-se acompanhar pelas tardes e noites sem dormir daquele diário, arrancando incansavelmente as folhas à procura de respostas, ansiando por reconforto, fortalecendo a sua postura, convencida do seu pensamento. Jacobo não tinha morrido num acidente, havia algo mais, não era nada fortuito!

      Jacobo já não estava mais ali, pelo menos fisicamente, mas tinha deixado uma série de pistas - pelo menos era o que a viúva pensava - uma rota marcada com migalhas de pão que precisavam de ser seguidas e que levavam a algum lugar; que poderiam revelar muita coisa. A borda do fio de lã que Teseu amarrou à porta do labirinto para encontrar novamente a saída.

      Só precisava encontrar a primeira pista; o primeiro sinal.

      Julia tinha a certeza de que o jornal era uma distração, que nem sequer era uma referência, que a mensagem deveria estar escondida na antiga livraria, propriedade de Jacobo.

      A Tia Julia não tomava como literal grande parte do diário, sabia que Jacobo tinha as suas metáforas; ele divertia-se com isso. Poderia referir-se a uma visita ao antigo mercado da quarta rua como uma viagem à terra santa; os trabalhos de contabilidade dos seus amigos estavam citados como o zoológico e os macacos; Jacobo Aguilar era um enigma; um divertido quebra-cabeças.

      Capítulo 6

      Fantasmas

      O trabalho de Velarde era antes de tudo rotineiro, monótono. Há muitos anos que deixara de ser entediante; poderia ter sido, quando se preocupava em perder tempo com outras coisas, mas não agora.

      Há algum tempo que decidiu deixar as ruas para se refugiar na área dos arquivos. Os seus joelhos já não funcionavam como deviam; o subsolo do prédio que abrigava os escritórios da Polícia Judiciária Federal haviam-se tornado o seu refúgio, o seu santuário. As centenas de caixas empilhadas e bolorentas eram a sua melhor companhia.

      Embora Velarde já não fizesse patrulha, mantinha a sua arma de ataque, tinha-a sempre consigo, carregada. Estava longe de ser nova, mas sempre a mantivera em boas condições. Tê-la recebido das mãos do próprio Gustavo Díaz Ordaz, concedeu-lhe, no mínimo, uma permissão vitalícia de posse de arma.

      Velarde preocupava-se em permanecer confinado, embora pudesse admitir que a princípio era confortável ter uma participação inativa na força policial, mas ultimamente desesperava-se por se sentir enferrujado. As ocasiões em que era considerado participante de uma operação eram raras, sem falar de uma invasão. Ele não tinha a confiança expressa dos seus chefes; mantinha a sua posição devido aos seus contactos no Distrito Federal (que eram cada vez menos) e por ser o único elemento que cobria férias, ausências e horas extras sem dizer uma palavra.

      Estava há tanto tempo naquele exílio na área de arquivos, que isso o deixou inadvertidamente maluco. Os ruídos que conseguiam filtrar do exterior foram gradualmente transformados numa voz interior desconfortável que o incomodava, que zombava da sua velhice prematura, da sua falta de mérito, da sua solidão; atormentando-o.

      Os murmúrios, o barulho do escritório, os olhares que não eram acompanhados por nenhum som; tudo era suspeito para ele.

      O que antes era o refúgio perfeito agora causava-lhe ansiedade, confundia as suas ideias, alterava-o ao ponto de ter fortes confrontos verbais com os seus colegas. Todos injustificados. Andava irritado; irascível.

      A gota d'água: um talão no para-choques do seu carro.

      Roberto entrou na esquadra a gritar, cheio de raiva, porque precisava encontrar o autor daquela canalhice e fazê-lo pagar por aquilo.

      A explosão de Velarde aumentou de tom até que ele passou de gritar a pontapear o bebedouro, o jarro de vidro caiu e estilhaçou-se no chão.

      A confusão chegou aos ouvidos do comandante que saiu do seu escritório para ver o que acontecia e, quando confrontou a cena, impôs ordem aos gritos, pediu que o local fosse limpo e ordenou que Velarde o acompanhasse.

      - Velarde…Velarde… Capitão Velarde!

      + Sim, Senhor! (Velarde saiu do seu transe e bloqueou).

      - Venha comigo! (gritou).

      Cheio de vergonha e tentando recapitular o que aconteceu, Velarde olhou para o rosto dos seus colegas que não acreditavam no que tinha acontecido: o polícia mais experiente e reservado tinha explodido como um caldeirão, expressando-se de uma maneira que ninguém conhecia, cheio de raiva. Agora, era invadido por um sentimento quase infantil de vergonha, podia-se até dizer que sentia vontade de chorar, como uma criança depois da mais terrível birra.

      No seu interior, ouviu uma voz que celebrava o sucedido - Sim, foi bom! Que fiquem a saber que não estás para brincadeiras!... Estiveste bem! És o Capitão Roberto Velarde! Até o comandante bateu continência, viste?... Idiotas!

      Velarde não ficou surpreso com o aparecimento daquela nova voz interior...


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