A meio da noite - Segura nos seus braços. Margaret Way
Se pelo menos…
Não, não ia desejar que estivesse ali.
Não precisava de nenhum homem para capturar uma aranha. E muito menos daquele homem.
Esqueceu a maçaneta ao suspirar e passou os dedos pelo cabelo.
«Consigo fazê-lo», pensou no silêncio. «Tenho de o fazer. Mais ninguém vai fazê-lo por mim».
Virou-se para encarar a porta da casa de banho e imaginou-se vestida com um dos seus fatos de trabalho e não de robe, com o cabelo apanhado como habitualmente à altura da nuca, sem cair sobre os ombros e a cara. Era tudo uma questão mental. Com determinação, podia fazer-se qualquer coisa.
Tinham-na enviado para um daqueles estúpidos seminários de treino quando trabalhava para a Fenton & Barrett. Fingira que prestava atenção, porém, na verdade estivera a pensar em como ia abrir a sua própria empresa de Consultadoria Empresarial. Depois, tornaria os seus sonhos realidade e, certamente, podia empregar o mesmo truque naquele momento.
No seminário, tinham falado de visualização. Concentrou-se e, na sua mente, a criatura da casa de banho transformou-se numa frágil borboleta de cores brilhantes.
Qualquer pessoa podia apanhar uma borboleta, ou não?
Abriu a porta de repente e aproximou-se da banheira. O fundo estava coberto de vidro partido, porém, a criatura que procurava estava a meio caminho da parte lateral da banheira.
– Borboleta – murmurou, enquanto estendia a mão e fechava os dedos sobre ela. A distância da beira da banheira até à janela de repente aumentou até adquirir a extensão de um campo de futebol. Tentou caminhar devagar, mas depois de um passo e meio, começou a correr. – Borboleta! – gritou, quando as patas começaram a torcer-se na sua mão. – Aranha, aranha, aranha, aranha! – gritou ao abrir a janela com a mão livre e atirar a coisa horrível. Depois, tremeu e esfregou a palma da mão no robe várias vezes.
Disse para si que naquele momento, sim, precisava do banho que planeara tomar. Contudo, antes de poder fazê-lo, tinha de tirar todos os fragmentos de vidro da banheira. Não havia ninguém para apanhar as aranhas nem ninguém que tirasse um caco que pudesse esquecer-se, de modo que era aconselhável que fizesse um bom trabalho.
Tinha a cabeça dentro do armário sob o lava-loiça na cozinha quando a campainha tocou. O sol acabava de se pôr e ainda havia luz suficiente para não ter de acender os candeeiros, mas estava suficientemente escuro para não conseguir encontrar a pá e a escova.
A campainha tocou outra vez e bateu com a cabeça na parte superior do armário. Não tinha uma campainha que pudesse ignorar, pois era uma daquelas insistentes que tinha um ruído tão estridente como uma velha campainha de bicicleta.
A única coisa que quisera naquele sábado à noite, depois de passar o dia todo no escritório, fora perder-se num denso banho de espuma e ler quatro capítulos do seu livro. Disse para si que não era pedir muito.
Esfregou a cabeça no ponto onde lhe doía e, silenciosamente, dirigiu-se para a porta, que abriu sem se importar com o facto de ainda estar de robe.
Ia soltar um seco: «Sim. O que deseja?». No entanto, as palavras morreram nos seus lábios. Apoiado contra a parede, com um brilho divertido nos olhos e uma covinha em cada face, encontrava-se o homem mais desesperante que tivera a desgraça de conhecer.
Sabia que ficara boquiaberta, mas não parecia capaz de fechar a boca. Ele sorriu e as covinhas acentuaram-se.
– Olá, Adele!
– Nick!
Nos últimos minutos, o sol descera ainda mais pelo horizonte suburbano e o brilho projectado pela luz do alpendre fazia com que, em contraste, ele parecesse quente e dourado.
Parecia tão… real. Não como o Nick com quem gritara mentalmente nos últimos nove meses. Na sua mente, imaginara-o mais baixo, mais juvenil e muito menos atraente. Pôde sentir a química familiar crepitar no seu cérebro.
Olhou para ela nos olhos e ela sentiu que perdia mais alguns neurónios.
Nick arqueou o sobrolho.
– O próprio.
Adele abanou a cabeça, sem saber por onde começar. O que fazia ali? Há quanto tempo estava no país? E, o que era mais importante, o que fazia à frente da sua porta, como se nunca tivesse acontecido nada?
– Posso entrar?
Teve vontade de lhe fechar a porta na cara, de lhe dizer que podia desaparecer e que, se fosse realmente imprescindível, entrasse em contacto com ela através do seu advogado, mas descobriu que estava a assentir. Sempre conseguira fazer com que fizesse o que ele queria. E, apesar das suas boas intenções, de forma estranha era ela quem acabava sempre magoada ou a ter de ordenar o caos.
Fora uma má ideia deixar que Nick Hughes entrasse na sua vida.
E fora uma ideia ainda pior casar-se com ele.
Adele caminhou pelo corredor seguida por ele. Assim que chegaram à cozinha, virou-se para olhar para ele.
– O que queres, Nick?
Era o momento por que ele esperara, o momento que vivera mentalmente tantas vezes que já perdera a conta. E, nos seus sonhos, nunca se sentira nervoso.
Adele virou-se para olhar para ele e Nick tentou não se encolher. Temera aquela possibilidade. Esperara, depois de tanto tempo encontrá-la mais propensa a falar. Era evidente que se enganara. O tempo não causara nenhum impacto no processo de cura.
Dizer-lhe sem rodeios o que fazia ali não ia funcionar, teria de ir devagar. Portanto, conteve a súplica que queria escapar dos seus lábios e, em vez disso, sorriu.
– Bela maneira de receberes o teu marido.
Adele semicerrou os olhos.
Ele respirou fundo. Tinha de fazer alguma coisa antes que o pusesse na rua. Tinha de, pelo menos, permanecer no mesmo edifício que ela até que o ouvisse.
– O que achas de uma chávena de chá?
Ela continuou a olhar para ele, com as pupilas a contraírem-se até ficarem do tamanho de uma cabeça de alfinete. Reconheceu que aquela frase não era o seu melhor esforço, mas tinha o cérebro em greve depois do que lhe parecera uma semana num avião, e uma chávena de chá oferecer-lhe-ia mais quinze minutos até conseguir convencer Adele.
– Fiz uma viagem realmente longa – acrescentou.
Ela ficou tão quieta, dura e fria como o granito das bancadas da cozinha. E precisamente quando achava que se tinha solidificado e que permaneceria dessa forma para sempre, abanou a cabeça e foi buscar uma chaleira. Vigiou-a bem. Quando Adele estava com aquele humor, a probabilidade de pôr a chaleira ao lume era tão grande como a de a atirar contra ele.
Encheu-a de água de costas para ele enquanto repetia a sua pergunta anterior:
– O que queres, Nick?
Ele esperou que se virasse.
– Precisamos de conversar.
Ela abanou a cabeça.
– Não. Precisávamos de conversar há meses. Agora é demasiado tarde.
– Tenho um assunto importante que preciso de discutir contigo.
– Pois!
Nick encolheu-se.
– O que significa esse «pois»?
– Tu não sabes o que é importante, não é verdade, Nick? Ou responsável, ou confiável, ou algo que possa requerer o mínimo de seriedade.
Adele estava à ofensiva. Todas as suas boas intenções caíram e recorreu à única forma de defesa que funcionava. Sorriu levemente.
– Faz parte do meu encanto.
Ela