A Vida No Norte. Tao Wong

A Vida No Norte - Tao Wong


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Nenhum Sistema Desvendar os segredos do Sistema

      — Quando recebi aquela demanda? — murmuro para mim mesmo, ao olhar para a primeira demanda na lista.

      — Eu aceitei aquela por ti, enquanto estavas a brincar às enguias.

      — Podes aceitar demandas por mim? — olho especado para o Ali. — Quanto controlo é que te dei, na realidade?

      — Não o suficiente, sortudo — o Ali sorri, antes de encolher os ombros. — Sou teu Companheiro, não posso fazer nada para te magoar e tu ias sair daqui de qualquer maneira, era indiferente se a aceitava ou não.

      — Está bem. Mas avisa-me, pode ser? Não gosto de surpresas dessas — fecho o separador e olho para ele durante mais algum tempo. — O que é exatamente um Companheiro?

      — Finalmente! Sou um Companheiro do sistema, um tipo de Espírito para ser preciso. Como Companheiro atribuído pelo Sistema, tenho acesso à tua interface e a certos aspetos do Sistema a que os utilizadores, em geral, não têm. Estamos ligados, por isso, quando ficares mais forte, eu também recebo mais habilidades. A Nível 2, tenho acesso à informação sobre os monstros que estão no Sistema, à nossa volta. Mais tarde, vou ser capaz de te fornecer mais detalhes e, a níveis ainda mais elevados, vou poder partilhar a minha Afinidade Elementar e até posso ganhar um corpo.

      Faço um aceno para agradecer e fico em silêncio, a ponderar o que ele disse. Parece que tê-lo como Companheiro ligado é mais poderoso do que julgava. Mesmo assim, ainda há muito para aprender.

      — Há um ficheiro de Ajuda?

      Ele mexe uma mão e uma caixa azul gigante de textos aparece à minha frente. Eu refilo e entro ainda mais para dentro da gruta para começar a ler. Horas mais tarde, tenho uma melhor compreensão do básico. Os atributos básicos são bastante óbvios. Contudo, curiosamente, a Resistência determina não só a minha Vida básica, como também o quão rapidamente me curo. Basicamente, os pontos saram à mesma velocidade por minuto. A Inteligência determina o tamanho da minha reserva de Mana, ao passo que a Determinação atualiza essa reserva a cada minuto, com base no seu valor estatístico. É claro que não sei se isso é muito útil neste momento, visto que não tenho nada que utilize Mana, mas a informação é boa na mesma.

      O mais interessante é que a Vida não é apenas o quão saudável estou fisicamente. Na verdade, é um valor numérico para a quantidade de danos que o Mana embutido no meu corpo iria absorver, atenuando os danos que sofro. Não impediria uma morte súbita, se enfiassem uma picareta no meu cérebro, mas reduziria a força do impacto da picareta, se tivesse uma reserva de Vida suficientemente grande. Claro que isso esgotaria algum do Mana embutido, reduzindo a minha Vida a um ritmo mais drástico. É muito estranho, principalmente porque o Mana embutido é completamente diferente do Mana que posso usar em feitiços. Enquanto luto contra outro bocejo, recorro a mais informações sobre as coisas que vi no quadro de estatísticas.

      As habilidades de classe são habilidades especiais, que dependem do Mana para produzir os seus efeitos. No geral, podem infringir muito ou pouco as leis da física, dependendo da própria habilidade. Alguns dos exemplos fazem-me lembrar filmes de ação ou anime. A habilidade de gerar fogo nas minhas mãos ou ter um corpo blindado parecem-me fixes.

      Os feitiços, por outro lado, eram apenas isso, feitiços de magia que utilizam Mana para serem lançados. A distinção entre o que é considerado uma habilidade e o que é considerado um feitiço parece-me um pouco arbitrário, mas talvez se torne mais claro quando receber um deles.

      E as Regalias... Bem, as Regalias são coisas que se ganham por completar demandas especiais ou apenas por estar no lugar errado à hora errada, ao que parece. Pequenas ou grandes vantagens em relação a uma pessoa normal, sem regalias.

      Agora, temos números, pontos para dizer quem somos, o que somos, aquilo em que, supostamente, somos bons ou maus. Tinha dado jeito, quando era mais novo, poder apontar para um ecrã e dizer “eu não sou quem vocês pensam” ou teria sido a mesma coisa? Se a minha vida tivesse sido ditada por este Sistema, será que teria tentado aumentar o meu Carisma ou teria treinado mais para ser mais forte? Teria falhado menos porque me teria concentrado em coisas às quais já era bom? Ou será que não teria feito a diferença?

      Suspiro, esfregando os olhos. Ainda há tanto para ler, tanto para aprender sobre este estranho mundo novo. Quero ler mais, mas já não consigo lutar contra a exaustão e os meus olhos começam a fechar-se.

      Parabéns. Sobreviveste um dia inteiro! Os humanos são mesmo uma raça excelente. Apenas 60% de vocês morreram, ontem. Estamos impressionados. Merecem um biscoito. E alguma experiência. Lembrem-se, os monstros vão aumentar durante a próxima semana.

      — 60%! — fecho os olhos, enquanto a minha mente tenta processar o significado daquele número. 60%, mais de quatro mil milhões de mortos. 60%, seis em cada dez pessoas que já conheci estão mortas. Seis em dez ... Isso significa que a minha família está morta, uma vez que eu estou vivo. Este último pensamento faz-me respirar com dificuldade, um abismo de dor a surgir. Tenho evitado pensar neles, no que este Sistema significa para o mundo, mas, com este anúncio, o sofrimento, a raiva e o arrependimento estão a acumular-se. O abismo de dor e as emoções conturbadas aumentam ainda mais, antes de serem afastadas e postas de lado, reprimidas. Não tenho tempo para lidar com isto agora, tenho coisas para fazer, a minha própria existência para manter.

      — Sabes, chorar é considerado algo muito masculino nas culturas de Kraska. Se bem que eles parecem os vossos crocodilos terrestres — o Ali flutua acima de mim e observa como lido com os meus pensamentos, antes de fazer desaparecer a notificação. — Vamos, rapaz!

      — Dá-me um momento — murmuro.

      — Não vais mesmo chorar, pois não? — pergunta o Ali, virado de cabeça para baixo, completamente aborrecido.

      — Não, não vou — afirmo com confiança. Consigo sentir o sofrimento, se me concentrar nele. Tal como a maioria das minhas emoções, está silenciado, como se houvesse um cobertor pesado sobre uma coluna. Está ali, apenas difícil de aceder. É o suficiente para eu funcionar, pelo menos, no geral. Mas consigo perceber, mesmo assim, que o sofrimento se está a misturar com a maré de raiva em que vivo.

      Raiva...

      — Ali, encontra algo para eu matar — afirmo calmamente e levanto-me com a mochila na mão. — Encontra montes de coisas para eu matar — por uma vez, o Ali não me responde e faz o que lhe peço.

      ***

      — Está morto — o Ali tenta apaziguar-me, quando dou uma última facada no esquilo-terrestre. Talvez tenha exagerado um bocadinho, o animal está desfeito. Ainda bem que a função de saquear não tem em consideração o estado do corpo da criatura e deu-me o prémio sem as feridas de faca bastante sórdidas.

      — Ali, como é que consigo uma arma melhor? — observo a minha faca e a criatura. Felizmente, satisfiz os meus desejos de miúdo e escolhi uma faca de mato. Para dizer a verdade, era demasiado apenas para acampar, mas estava numa fase de Rambo quando a comprei. Agora, é a minha única arma. Bem, isso e uma lata de spray contra ursos.

      — Na Loja do Sistema. É num local seguro gerado pelo Sistema que, atualmente, só existe em Whitehorse. Mas vais ter de vender o teu saque para a conseguir, a não ser que ganhes alguns créditos do Sistema, algo que apenas os sencientes recebem — o Ali continua a explicação. — Ainda tens de deitar cá para fora os teus sentimentos?

      — Vamos sair daqui — abano a cabeça, a raiva finalmente a acalmar. Não sei bem o que diz sobre mim, o facto de ter descarregado naquelas criaturas. Mas, por agora, vou evitar pensar nisso. Já vamos a meio da manhã e ainda não consegui fazer muitas mortes. Caçar está a tornar-se cada vez mais perigoso, uma vez que até as criaturas da Terra se estão a mutar a um ritmo mais acelerado, superando


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