Um Julgamento de Contos de Fadas a Colarinho Branco. Marcos Sassungo

Um Julgamento de Contos de Fadas a Colarinho Branco - Marcos Sassungo


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Santa, pai.

      – Está bem, filho, eu entendo. Mas, filho, não fiques com medo. Isso é normal, a primeira vez. Eu senti-me assim também quando conheci a sua mãe. Hoje quando tu a vires, não digas nada, apenas sê tu mesmo e espera ela vir ao teu encontro. Isso significa que ela teve saudades. E quando estiveres a sós com ela em algum lugar da escola, na cantina ou por aí, diz tudo o que tens aí dentro. Tudo. Não guardes nada.

      – Está bem, pai. Mas, pai, já fez dois anos que eu nunca disse nada a ela e esse é o último ano e queria que ela soubesse do resultado da agressão genética que ela causou em mim com a sua beleza.

      – Filho, fica calmo e não te desconcentres. Disse ele e acresceu: “vais conseguir, amigão, sê firme. Agora me dá um abraço”.

      – Bom trabalho, pai.

      – Bons estudos, filho. Eu amo-te.

      – Eu também te amo, pai.

      O Tino saiu do carro, cumprimentou o segurança radiante, e juntou-se aos colegas, abraçando-os afectuosamente. Marcos era um dos seus melhores amigos na academia. Seus valores e princípios eram semelhantes. Ambos celebravam a amizade profunda e Marcos, sabendo da afeição de Tino por Santa, disse:

      – Tino advinha quem está aí ma men!

      – A Santa, é claro! RespondeuTino.

      –É isso aí, meu caro. A Santa Joaquina e penso ser desta vez que tens que ser sério. Aquela conversa que tivemos ao telefone nas férias eu não a esqueci não, meu!

      – Tem razão, brother, eu preciso de me declarar a ela e tem de ser para breve.

      E avistando de longe a Santa, disse o Tino, olha para ela, seu sorriso é um encanto natural, sua voz é a melodia mais colorida que já terei ouvido. Ela é simplesmente linda aos meus olhos e no meio de todas, eu quero escolhê-la como minha namorada. Mas tu me falaste da Zenga e como ficou o teu caso? Perguntou Tino ao Marcos.

      – Sonhador… Para de sonhar, vai dizer isso a ela. – Disse Marcos e acresceu: o meu caso é outro e precisa de uma outra abordagem. E por agora precisas de te conconcentrar no teu caso.

      – Agora ainda não. Respondeu Tino. A professora de Língua Portuguesa já aí vem e por hoje teremos os dois primeiros tempos.

      Desafiar as mentes jovens a pensar e criticar, é a missão dos professores pelo mundo todo e desafiar o mercado da vida com uma mente crítica e sagaz é a missão dos estudantes. E lá estava a professora com mais uma missão.

      – Bom dia, turma. Comprimentou.

      – Bom dia, senhora professora.

      – Tomai os vossos assentos. Disse ela e acresceu:

      Como vocês já sabem, eu sou a professora e coordenadora desta disciplina de Língua Portuguesa. Juntos analisaremos minuciosamente o livro Aparição de Vergílio Ferreira. Durante o semestre estaremos viajando nas ideias do autor, colocaremos a nossa mente à disposição de concorrer ao pináculo do saber. Pelo que, vos convido a comprar o livro de leitura obrigatória da décima segunda classe nesta instituição, pelo que o mesmo será o nosso objecto de estudo e a Gramática do Português Moderno bem como o tradicional Dicionário “Prestígio” de Português, fará parte desta viagem no espaço do conhecimento. Há alguma pergunta por acaso?

      Silêncio total.

      – Ok, então, vos convido a convidar as vossas mentes a um exercício, eu vou ler um texto e vocês acompanham.

      Tristezas… Plural de um mar de sentimentos que chicotea a alma e o espírito. Paradigma de um coração provocado pelas lutas dessa sociedade humanamente desumana com a dor da bondade. É só por isso que eu não mais confio nela. Pois ela, a alma mo aliciou. Sem dó e sem piedade roubou-me o tudo que tinha e deixou-me no vazio do nada. Agora essa sociedade já não me é amistosa, pois nela não há mansidão e ignorou os meus sonhos, não visitou as minhas lágrimas e não enxugou as minhas tristezas. Usei as suas cores de preto no branco e do amarelo no vermelho para catapultar a sua fama e engrandecer o seu joio. Mas ele não deixou que me apaixonasse, transplantou-me a felicidade, e em troca a tristeza, me implantou na alma do meu espírito. E no âmago da minha dor, no labirinto da minha alegria triste e profunda de mais para minha alma e coração, ouvi um sussurro das lágrimas e das dores das lágrimas, uma voz de tristeza, mas com um soar de alegria. Mostrou-me o céu, mostrou-me o mar imperfeitamente perfeito, mostrou-me a felicidade escrita ao lado de alguém que não me parecia familiar, era esbelta e linda de mais para descrever… Perdoe a sociedade e ande comigo disse ele. Aí eu percebi que a voz no fundo era de Jesus.

      – Ponto final. Autor é desconhecido e agora a vossa tarefa é dar um título ao texto e comentá-lo.

      – Posso? – Perguntou Juelcy à professora.

      – Claro, filha. Tenha bondade.

      – Obrigada Senhora professora. Disse a Juelcy e acresceu: “A dor da alma. É esse o título que dou”.

      – E porque a dor da alma? Perguntou a professora.

      – Porque pressupõe um texto poético e autodiegético, e com uma linguagem corrente. O autor se apossa das palavras tristeza, alma e espírito para exprimir seus sentimentos profundos, causados pela solidão. E por ela, critica o comportamento da sociedade versus a desvalorização do ser humano em si. O autor ainda usa palavras como lágrimas, dor, bondade, mansidão e perfeição para fazer menção a Tristeza de uma alma insatisfeita por não se conformar com a realidade.

      – Muito bem, Juelcy… mais alguém para argumentar?

      – Sim, professora. Respondeu o Angelino.

      – Então, Angelino, que título darias ao texto e diga o porquê.

      – Esperança. Esse é o título que eu daria ao texto. Justificativa: É um texto poético, e tal como a colega Juelcy disse, eu confirmo ser autodiegético e o autor descreve a perturbação da sua agonia, diante da sociedade e atribui a culpa a ela pelo facto de havê-lo trazido à tristeza e solidão. Mas ao perder a sua amada vê-se agonizado. E aí, ele ouve uma voz, estranhamente, esperançosa, irreconhecível no princípio e que o convida a perdoar a sociedade pelos seus feitos maléficos. Percebe-se logo que, a voz irreconhecível no princípio e reconhecível no final era a de Jesus, tal como o autor desconhecido o descreve.

      – Obrigado, Angelino. Mais alguém? Bem, o silêncio diz que não. Mas obrigada. Juelcy, obrigada Angelino. É esse tipo de exercícios e outros também, que faremos nesse livro “Aparição” de Vergílio Ferreira. E estou ciente dos vossos conhecimentos em Língua Portuguesa aprendidos através do professor Nascimento Dinis na décima e na décima primeira classe. É, pois, através destes conhecimentos que estaremos viajando nos feixes do pensamento de Vergílio ferreira e de certeza aprenderemos outras técnicas que sem nenhum revês nos ajudarão. Relativamente ao livro, quero dizer-vos, de antemão, que também a presença de um narrador autodiegético é uma característica determinante. O sujeito enunciador revela-se a si mesmo à medida que se vai apropriando linguisticamente do fluxo das vivências que decorrem no mundo, como é evidente nos textos de abertura e fechamento do romance, que, situados num tempo pós-trágico de reflexão, funcionam como parênteses que sugerem uma libertação da visão do narrador em face da acção contida entre eles: "Sento-me aqui nessa sala vazia e relembro". Portanto, a acção inicia-se com a chegada a Évora de um novo professor, Alberto Soares, no início de mais um ano lectivo. Alberto, o narrador, cedo se relaciona com o Doutor Moura, antigo colega do seu pai e o seu círculo familiar, nomeadamente Ana, casada com Alfredo Cerqueira, Sofia, de quem se tornará explicador de Latim e Cristina, a filha mais nova da família.

      Neste espaço familiar, circulam também as figuras de Carolino, um dos seus alunos do Liceu e o engenheiro Chico, um amigo da família, espécie de neorrealista militante. O espaço urbano de Évora tem como contraponto o espaço rural da montanha onde Alberto viveu a sua infância, e ao qual temos acesso através de analepses que nos dão conta do crescimento dessa personagem, designadamente, a descoberta do seu próprio eu, em face


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