Nakba. Aníbal Alves

Nakba - Aníbal Alves


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furtivo, sentiu as águas felizes dela, tempestuosas e cálidas, inundarem as pétalas orvalhadas da flor e os gemidos de volúpia da mulher mais acenderam seu ânimo másculo, cujo instinto de cópula o incitou a devassar com uma estocada sádica a bainha daquela vagina que implorava o seu pénis. De imediato, sentiu a reação feminine, que lhe respondeu com uma trincada na orelha seguida de um gemido ansioso:

      — Ai, amor, usufrui em mim do teu ardor! Anda, querido, dá-me tudo!

      Segurou-a pelas meias-luas do traseiro e num ritmo forte de ir e vir, de vir e ir dentro dela, usufruiu o deslizar nas carnes tenras e cálidas, que no ardor esquecido pela longa viuvez se contraíam em espasmos de prazer venéreo. Foi na avalanche do gozo, no deliquar entre a fronteira do presente e da volúpia inserida no tempo imutável, que a vergonha se escondeu por não ter mais pudor e que a deliciosa sensação de se sentir outra vez fêmea a fez expandir em entrecortados gorjeios há muito pendurados em sua garganta. A torrente feliz esguichou dentro da vulva escaldante e ele urrou como fera ferida, na tempestade do orgasmo, e misturou os dois fluidos que extravasaram da flor dela, para deslizarem pelas pernas contraídas na conceção sexual da lascívia.

      — Ai, amor! Você é um querido! Ai, Stein, amo-o e quero-o meu. Sou possessiva!

      Ambos embalados pelo sentir que os unia, como se passeassem numa praia tropical à luz romântica do luar, sem a preocupação de saber se eram observados, encaminharam-se para o aconchego das respetivas casamatas, onde Morfeu os esperava; era véspera do desembarque. Apitos, gritos, uma cacofonia de sons e do ranger das amarras misturaram-se à emoção da atracagem e fizeram descorar a segurança. Foi necessário fazer valer a liderança para assegurar um desembarque ordeiro e, para gáudio de todos os chegados, as ameaças de turbulenta receção não se concretizaram. Era festivo o ambiente do cais onde muitos dos emigrantes até tinham familiares aguardando. Era o caso dos Katz, cujo irmão do falecido Theodore esperava a cunhada e os sobrinhos. Logo que a Sr.ª Katz desceu o portaló de desembarque, foi efusivamente saudada pelo Sr. Albert Katz e mais dois cavalheiros bem aperaltados, que Berger veio a conhecer como dois advogados ligados ao tal projeto proposto pela sua amiga e que também eram acionistas do mesmo empreendimento.

      Quando Stein pousou o saco sobre o empedrado do cais, logo Abba, o filho mais velho da Sr.ª Katz, veio ao seu encontro com um sorriso e fazendo um gesto para tomar a sua bagagem, comunicando-lhe:

      — A minha mãe pede para o senhor conhecer os seus sócios, que residem em Eilat.

      Ainda indeciso, lá seguiu o jovem até o café onde a uma mesa abancavam a família e os cavalheiros subscritores.

      — Venha, Sr. Stein, tenho aqui um lugar para tomarmos uma bebida. Que toma?

      Mesmo antes de se servir, o cunhado de Ashira estendeu-lhe uns papéis onde estavam explicados os projetos da Sociedade, ao mesmo tempo que lhe murmurava com entusiasmo:

      — Eilat é uma mina de ouro ainda não explorada; temos que iniciar a sua abertura para extrair dela um futuro grandioso e lucrativo, antes que os americanos se apercebam deste filão implantado no Mar Vermelho.

      Berger gostou da maneira como o plano lhe foi apresentado e resolveu ali mesmo investir uma nota de crédito do seu banco UBS, no valor de 20.000 dólares. Selou o pacto com a sua assinatura e todos fizeram um brinde de êxito ao novo acionista.

      Já a caminho do escritório da Agência de Notícias da Herold, fez uma retrospetiva da sua vida nos últimos tempos e novamente aquele ultimato da maldita ocupou-lhe a mente: «Continuarás amaldiçoado pelo meu nome secreto e só te livrarás do meu anátema quando praticares a salvação de uma jovem em perigo de vida e a protegeres para sempre»— — uma vez mais sentiu-se vazio por dentro e bandalho no coração; tinha chegado ao desprezo absoluto pelos outros e, como tal, era justo ser desprezado por si próprio. Ganhou um pouco de ânimo e, num folgo, interrogou-se: será que encontraria naquela terra estranha o caminho para mudar de vida? Para encontrar a dignidade de antes, aquela inocência que foi apagada com a sua subserviência ao jogo sujo dos nazis, onde mergulhou na escuridão a sua alma e a honra de ser humano? Era esta culpa que destruía a essência de tudo o que poderia ser um lampejo do bem em si. Sentiu-se mal com o vazio que era o valor do nada em sua vida e o caricato da situação é que nem coragem encontrava na esperança de encontrar uma janela que lhe apontasse uma nesga de claridade no horizonte do caminho, para ao menos tentar a via que o feiticeiro lhe indicara, para se livrar do travo amargo que era a maldição da cigana.Tentou abstrair-se daquele pesadelo. Era um repórter em terreno ensanguentado por uma guerra fratricida e estava sobre uma mina prestes a explodir. Releu a placa da Herold e entrou.

      Dois sujeitos amigáveis no trato e ligados à administração receberam-no efusivamente e, depois de uma conversa breve e amena para o porem ao corrente do que esperavam dele, o acordo ficou assinado com dois apertos de mão.

      A tiracolo, uma Zenit de repórter e no saco um fornecimento substancial de rolos fotográficos para captar durante meses as tragédias de uma guerra que se adivinhava cruel na vingança e atroz no sentir; era sem quartel! Ele tinha sido apologista da criação da célebre Legião Judaica proposta por Vladimir Jabotinsky, em 1935: homens obedientes até à morte! O tal movimento que foi abençoado por Mussolini, por intermédio de um seu colaborador judeu, César Sarafatti. O Duce propunha, para o êxito dos judeus, uma aliança com os fascistas italianos, para conseguir um estado independente, uma bandeira e uma língua próprias e, para enaltecer o fascismo do líder judeu, deu-lhe o título de Cidadão Fascista. Jabotinsky aceitou no seio do seu movimento dois grupos paramilitares: a Irgun e o grupo Stern. Ambas as organizações tinham por missão prioritária combater os ingleses na Palestina e a Irgun, sob o comando de Begin, era a favor de uma revolta imediata contra os britânicos. A Stern era a favor de uma luta contra os ingleses, mesmo durante a guerra, com o apoio alemão e para o efeito ofereceu a Hitler um exército de 40.000 homens a serem treinados pelos nazis. Esses soldados seriam oriundos da Europa Oriental e seria o início de uma aliança com o Eixo apadrinhada por Mussolini, mas Hitler rejeitou e preferiu apostar na carta árabe por causa do petróleo. Mas para quê estar a desperdiçar o tempo para uma bebida com pensamentos retrógrados? Israel já era um estado independente por decreto das Nações Unidas e já tinha enfrentado com êxito cinco países da região. Agora era só consolidar as fronteiras e ocupar legalmente as propriedades que pertenciam aos verdadeiros palestinianos. O barão Rothschild tinha já contribuído com avultado financiamento, para comprar essas terras agricultáveis que se destinavam a desenvolver as chamadas cooperativas sociais, os kibutz. Tudo se preparava para dar curso às promessas messiânicas e concretizar o sonho de Bem Gurion em 1937 — «Uma maioria palestiniana compelirá os colonos judeus a usarem a força para provocarem o sonho: uma Palestina puramente judia!» Ele tinha afirmado também:

      «Os palestinianos podem ser presos em massa ou afugentá-los; é melhor expulsá-los!» — E mais afirmou: «As fronteiras de Israel serão decididas pela força e não pelo diálogo!»

      Estas cogitações foram bruscamente interrompidas pelo tinido do telefone:

      — Olá, camarada! Amanhã de madrugada deves acompanhar o teu grupo, conforme o juramento. A partir da tua chegada ao sagrado solo da Terra Prometida, serás um dos seus libertadores. Seremos nós a dar-te a verdadeira informação sobre os combates a travar na luta pelo que nos pertence, o que nos foi oferecido por Javé, o Altíssimo! Serás um privilegiado repórter ao serviço da nossa causa. Estranhando aquela algaraviada de palavras destituída de nexo, interrogou:

      — Mas quem raio é você? — Uma gargalhada sarcástica soou no auscultador:

      — Já esqueceste o juramento de: «obediente até à morte»? Prepara-te para assumires!

      Foi como um balde de água fria sobre a sua cabeça já aquecida pela recordação maldita. Sim, ele jurara fidelidade absoluta e obediência incondicional quando se filiara na Irgun de Begin.

      No improvisado campo de Schoa, em território jordano junto ao Mar Morto, tinham-se albergado milhares de desalojados e cada um com a sua história sobre o sadismo e a brutalidade dos malditos sionistas judeus. Ali se encontravam amontoados, sem teto, nem alimento, mulheres, crianças e velhos impiedosamente


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