Nakba. Aníbal Alves

Nakba - Aníbal Alves


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para acompanhá-la ao , pois desejava ver a lua cheia refletida no espelho das águas e como ele não mostrasse qualquer entusiasmo em servir de guarda à noiva, como se fosse um alcoviteiro, esta tanto insistiu que ele a acompanhou. Enquanto ela fazia pedidos à imersa lua com engrimanços aprendidos de ciganas mais velhas, Gilad se entreteve a atirar seixos à água, num jeito que os fazia bater no líquido fluido e saltavam duas e três vezes antes de se afundarem. Como Porcina o observava com curiosidade, ele desafiou-a a imitá-lo e esta, sem se fazer rogada, pediu-lhe para a ensinar naquela técnica de fazer deslizar as pedrinhas antes de se afogarem. Tudo começou quando ele, na tarefa de instrutor, deixou que uma mão deslizasse sobre um dos duros seios da cigana. Esta, com intenção ou por acaso, segurou-lhe a mão prevaricadora e pediu-lhe num sussurro:

      — Gilad, eu sei que tu és um rapaz muito discreto e sabes que eu vou em breve casar, assim espero que continues a manter a boca fechada.

      Ele sorriu com ronha, pois não era a primeira vez que ela o tinha treinado na arte de beijar e, esperando o seu pedido, deixou que fosse ela a tomar a iniciativa. Recordava-se bem daquele seio pequeno e duro de mamilo rosado que ela pediu para ele acariciar. A sofreguidão foi tal que Gilad não parava de sugar enquanto desnudava o outro também para acarinhar. Porcina ficou de tal maneira excitada que, dando fé do pénis dele a forçar o tecido da carcela, olhou-o com picardia e pondo um dedo em riste sobre os lábios como avisando para manter o silêncio, ajoelhou-se na sua frente, desabotoou a braguilha, beijou-lhe a glande tumefata, como se lambesse uma gulodice e… Kalila nem lhe respondeu, olhou-o daquele jeito enamorado, cujo gesto era um convite e ele, sem complexos, afastou o lençol e exibiu a haste em plena tumescência; Kalila soltou uma gargalhada e expressou:

      — Ai, querido, eu nunca fiz, mas desejo satisfazer o meu homem como a minha tia sabia satisfazer o meu tio Rico. Soergueu-se e, sempre rindo, passou a polpa dos dedos pela glande como se fosse masturbá-lo; olhou-o fixamente e, ao sentir a sua aquiescência, beijou aquela cabeça encrespada de vigor. Numa arremetida sôfrega, abocanhou o falo na plenitude do seu orgulho e iniciou um ir e vir lento e suave sobre a pele brilhante e sedosa daquele membro que já lhe tinha provocado três deliciosos clímax, embora na primeira vez lhe tivesse causado um pouco de dor. Sentiu os dedos dele passeando sobre os seus cabelos e de repente aquele empurrar para baixo como se temesse que ela o deixasse a sós com a volúpia que o emergiu, naquela tempestade de prazer que ele não conseguiu silenciar:

      — Ai, ai! Querida minha, tu matas-me de gozo, Kalila, meu amor, ai!

      Ela libertou-se dele e correu para a casa de banho para cuspir aquela semente que podia ter valido uma gravidez. Lavou a boca daquele sabor e sentiu-se arrebatada de desejo. Sentou-se, abriu as pernas e com a polpa dos dedos deslizou no vértice das coxas, primeiro um roçagar lento e leve como o escorregar de uma pena, depois já afogueada de excitação, introduziu em si dois dedos e resvalou-os com sofreguidão entre os lábios interiores da vulva. Semicerrou os olhos para curtir em plenitude a lembrança daquele pénis que a devassara e sentiu a profusão de cores e luzes como se fossem asas de uma Fénix desabrochando ao sol. Possuída na urgência de expandir a luxúria que se acoitava na sua garganta, respirou fundo para evitar o grito de satisfação que lhe travava a respiração e a obrigava a cerrar os lábios contraídos, que prendiam o sustenido som suspenso em sua alma, porque o prazer de uma cigana também era propriedade do seu homem. Era sua obrigação contentá-lo e jamais se aproveitar da cópula para usufruir da luxúria dele. Riu-se com a sua obrigação, lavou-se e perfumou-se para novamente despertar o desejo de Gilad.

      * Alves, Aníbal. O Cruel Josué: Josué, filho de Nun. Lisboa: Edições Ecopy, 2009.

      ** N. do Ed.: “A família Rothschild é uma família judia, com origem em Hamburgo, Alemanha, que estabeleceu uma dinastia bancária na Europa. Prosperou no fim do século XVIII, e chegou a ultrapassar as mais poderosas famílias bancárias rivais da época, como a família Baring e a família Berenberg.” (fonte: Wikipedia)

      Capítulo 3

      Acomodar 600 pessoas de diversas proveniências, embora da mesma etnia, num barco caquético que tinha escapado às investidas dos U-Boots alemães no Atlântico Norte, não era de molde a encantar um promotor de viagens turísticas. Aquele navio era o Algor e navegava sob bandeira panamiana, por conveniência estratégica e porque não correspondia minimamente às condições exigidas pela Lloyd para o transporte de seres humanos. Tinha de fato sido submetido a uma reconstrução reparadora que, entre outros benefícios, transformara os camarotes da tripulação, tornando-os mais amplos e suficiente para acrescentar um andar de beliches. Também os seus quatro porões de carga a granel foram transformados em camaratas tipo militar, com divisões para: homens, mulheres e crianças.

      Tinha zarpado de Malmo, no sul da Suécia; havia quatro dias e já a costa ocidental da Ibéria o espreitava desde o Cabo da Roca, junto a Lisboa, quando o capitão foi alertado via rádio, que uma tempestade se formava ao largo das Berlengas; assim ao comandante daquela embarcação se apresentou o dilema: arrostar com o perigo e confiar na providência divina e na robustez de um barco cujo casco rebitado era ainda suficientemente forte para enfrentar as arremetidas de Polifemo ou apostar no seguro de um porto e sujeitar-se a uma quarentena sanitária exigida pelas autoridades portuárias de um país dominado por uma ditadura fascista que nada fizera em prol dos judeus durante a guerra. Isso implicava um atraso substancial no programa sionista de emigração a toda a força e expressiva, em número, para ocupar o espaço deixado pelos escorraçados proprietários palestinos, os verdadeiros donos da terra. Afoitou-se o veterano capitão dinamarquês, depois de consultar os líderes dos judeus a bordo, e nessa mesma tarde, já o crepúsculo caminhava para o lusco-fusco de uma noite que se presumia agitada, sentiu a primeira vaga embater com violência na vante do Algor, como prenúncio da batalha que se avizinhava. A ordem partiu serena, mas apreensiva, e os tripulantes já acostumados a enfrentar aquele tipo de situações, perante o terror dos viajantes, iniciaram os preparativos para o fecho dos porões, agora metamorfoseados em camaratas de três plataformas, que, devido à má distribuição da claridade, no sobe e desce do velho casco deturpava nas sombras a visão dos leitos e os assimilava a nichos escavados nas anteparas e no cavername, quando a iluminação esbatia nas pessoas que se moviam naquele exíguo espaço. Para distrair o pavor que havia em todos, algumas mulheres se atarefavam em redor dos fogareiros, aquecendo água para fazer chá e assim entreter a vigília às vagas que as aterrorizavam quando as sentiam chicoteando o convés. A infusão quente, além de aliviar o medo, também servia de lastro aos estômagos que devido àquela ameaçadora borrasca não puderam aconchegar a refeição da noite.

      Berger Stein, nomeado desde a partida de Malmo para dar apoio logístico naquela camarata, ordenou que se apagasse tudo quanto era lume, mesmo os poucos candeeiros a gás ou petróleo, para evitar que o derrame de combustível desse azo a algum foco de incêndio. Concordou, no entanto, com o pedido da Sr.ª Katz, para que todos os ocupantes: homens, mulheres e até crianças se reunissem numa prece ao Senhor, clamando por socorro e salvação. As mulheres foram as primeiras a apoiar a ideia e este apoio tornou-se oficial quando um ancião tirou o kippah e o ofereceu a Berger, para tornar a oração mais solene. Também a Sr.ª Katz, remexendo num baú, exibiu um longo tallit de cor azulada e o ofereceu ao jornalista, adiantando:

      — Este era do meu Theodore e só o confio a quem me merece confiança!

      Entre os dois brilhou um sorriso cúmplice de um porvir intuitivo, que a situação do momento adiou. A imponência do paramento dava ao orador uma solenidade acrescida do misticismo rabínico e foi investido dessa importância que deu início à prece:

      — Escuta, ó Israel, o Eterno é nosso Deus, bendito seja o Seu Nome para sempre. É neste momento delicado, quando as agruras do mundo nos açoitam, que nós, seguindo os ensinamentos dos nossos pais, recorremos à tua bondade e ao teu poder sobre os elementos que nos ameaçam, para que o teu auxílio nos livre…

      Para alívio de todos, puderam passar o resto da noite tranquilamente e, para gáudio das crianças, o novo dia se apresentou com um luminoso


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